Artigo
Diane Williams & Jennifer Oades
A taxa de encarceramento de mulheres disparou globalmente em aproximadamente 53% desde 2000 e superou a taxa de encarceramento de homens, que vivenciou um aumento de cerca de 20% durante este mesmo período (1). Embora tenham se passado 10 anos desde a adoção das Regras de Bangkok, é evidente que o progresso global nesta área foi lamentavelmente baixo.
As mulheres em conflito com a lei têm caminhos únicos para o sistema de justiça criminal e suas necessidades específicas devem ser reconhecidas e abordadas por meio de procedimentos e práticas de prisão e liberdade condicional baseadas em evidências e com uma perspectiva de gênero.
Um dos pontos fortes da Associação Internacional de de Serviços Prisionais e de Correção (ICPA) é que seus membros são compostos por funcionários do governo, profissionais, agentes penitenciários, formuladores de políticas, pesquisadores e outras partes de todo o mundo interessadas em avançar nos sistemas penitenciários e de justiça criminal. É através de associações internacionais como a ICPA, que podemos ser uma voz de influência para a mudança.
O Comitê Gestor da Força-Tarefa de Além das Prisões: Mulheres e Penas Alternativas na Comunidade é composto por um grupo de agentes penitenciários, profissionais, diretores e acadêmicos de várias partes do mundo.
Esse grupo de pessoas tem o interesse compartilhado em examinar maneiras pelas quais podemos abordar ativamente as desigualdades enfrentadas pelas mulheres e mudar para um sistema de penas baseado principalmente na comunidade.
O objetivo da Força Tarefa é desenvolver um quadro abrangente e um modelo globalmente inclusivo, com o propósito de orientar governos, formuladores de políticas, profissionais, academia e outros parceiros sobre como os sistemas atuais de prisões e liberdade condicional para as mulheres podem ser melhorados.
Acreditamos que a comunidade tem um papel central e fundamental a desempenhar no desenvolvimento de uma abordagem bem-sucedida, holística e centrada nas mulheres. Também acreditamos que as alternativas comunitárias devem ser uma pauta generalizada e predominante dentro da justiça criminal e dos sistemas penitenciários.
As prisões são utilizadas de maneira excessiva e a solução para comunidades mais seguras e saudáveis reside em melhores serviços e programas na própria comunidade.
Dois terços das mulheres encarceradas são mães e o uso cada vez maior da prisão para mulheres tem um impacto negativo sobre seus filhos. É preciso focar no apoio a alternativas aos serviços prisionais e comunitários e programas onde pode ocorrer uma reintegração bem-sucedida.
Atividades da força-tarefa e principais conclusões até o momento
No início de sua gestão, a força-tarefa buscou informações de diversas fontes internacionais para identificar tendências, estatísticas, programas e pesquisas relevantes específicas para mulheres em conflito com a lei e para melhor orientar nossas atividades.
Em 2019, realizamos uma revisão bibliográfica e, em junho desse mesmo ano, fizemos pesquisas com vários profissionais, agentes penitenciários e pesquisadores através da ICPA sobre programas ou políticas que considerem questões de gênero dentro de suas prisões e comunidades.
Em outubro, a força-tarefa também realizou uma reunião de consulta com partes interessadas internacionais na Conferência Anual da ICPA, em Buenos Aires.
Através de nossa consulta, esforços de pesquisa e discussões com as partes interessadas, descobrimos que há um interesse internacional muito aguçado em programas e pesquisas sobre questões de gênero.
Não surpreende, porém, que também tenhamos descoberto que os desenvolvimentos e/ou avanços nessa área têm sido escassos. Dado o aumento significativo da taxa de encarceramento de mulheres no mundo todo, acreditamos que é urgente investir os recursos adequados e realizar pesquisas sobre iniciativas específicas de gênero para melhor orientar as práticas.
A força-tarefa esteve envolvida em muitas atividades; desenvolvemos um site onde os visitantes podem encontrar mais informações sobre a iniciativa. Também distribuímos um boletim informativo trimestral que destaca eventos atuais, programas e pesquisas específicas para mulheres em várias partes do mundo.
Em dezembro de 2020, tivemos o prazer de moderar o evento “Estratégias para Mulheres Infratoras” da ICPA, que teve como palestrantes a Dra. Chontit Chuenurah (do Instituto de Justiça da Tailândia – Thailand Institute of Justice) e Emilie Coyle (da Associação Canadense de Sociedades Elizabeth Fry – Canadian Association of Elizabeth Fry Societies).
Mais recentemente, a força-tarefa produziu um Guia de Análise de Custo-Benefício, destinado a organizações centradas em mulheres e organizações parceiras responsáveis por programas de tratamento, com intuito de identificar o custo-benefício e/ou custo-efetividade de seus programas, para que possam angariar apoio financeiro e político. Agora estamos procurando parcerias com organizações e associações para testar o guia em tempo real.
Impacto da pandemia em questões específicas de gênero em ambientes penitenciários
Infelizmente, doenças transmissíveis como a COVID-19 podem se espalhar mais facilmente dentro das prisões devido ao grande número de pessoas nos edifícios, ao uso de espaços compartilhados e ao contato próximo entre detentos e funcionários. Vimos a propagação do vírus acontecer rapidamente nas prisões quando não controladas.
Também vimos programas comunitários serem significativamente reduzidos durante a pandemia, dificultando muito a reintegração à comunidade. Tem sido particularmente desafiador para as organizações que atuam com programas de tratamento e agentes penitenciários, pois eles precisam garantir a saúde e a segurança dos apenados e funcionários.
Uma pesquisa recente da Organização Mundial da Saúde envolvendo 130 países relatou interrupções significativas nos serviços de saúde mental, aconselhamento e psicoterapia, incluindo o acesso a medicamentos para transtornos de saúde mental e uso de substâncias (2).
As mulheres têm sido mais impactadas negativamente durante a pandemia, pois enfrentam mais barreiras para a reintegração na sociedade após sua libertação da prisão do que os homens. Isso acontece devido a maiores taxas de transtornos concomitantes, problemas de saúde mental, responsabilidades de cuidar das crianças, acesso a moradia segura, emprego limitado e pobreza (3).
Acolhendo a participação e estabelecendo cooperação com as partes interessadas
Estamos extremamente satisfeitos com o nível de engajamento da comunidade internacional e de outras associações de justiça criminal e penitenciária.
Já se passaram cerca de dois anos desde que a força-tarefa foi criada e recebemos continuamente mensagens de pessoas interessadas em contribuir e/ou conhecer mais sobre o que estamos fazendo.
Esperamos que esse nível de participação e interesse continue, à medida que as informações sobre este grupo de trabalho sejam divulgadas graças a revistas como a JUSTICE TRENDS.
Referências
(1) Walmsley R. (2018), World Prison Population List, 12th edition, Institute for Crime and Justice Policy Research..
(2) Organização Mundial da Saúde. (2020). The impact of COVID-19 on mental, neurological and substance use services: results of a rapid assessment; Genebra.
(3) National Resource Center on Justice Involved Women. (2012). Ten truths that matter when working with justice involved women. Washington, DC: U.S. Department of Justice, Office of Justice Programs, Bureau of Justice Assistance.
Diane Williams
Diane Williams foi nomeada presidente emérita da Safer Foundation em abril de 2014 depois de ter atuado como presidente e CEO por mais de 18 anos. É formada em educação e administração de empresas, e possui mais de 20 anos de experiência trabalhando em justiça criminal. Diane é tesoureira da ICPA e também da Associação Internacional de Psicologia Penitenciária e Forense. Também faz parte do Conselho de Administração do Conselho de Justiça Criminal (EUA). Em 2011, recebeu o prêmio de “Campeã da Mudança” do presidente Obama.
Jennifer Oades
Jennifer Oades é a presidente do Conselho de Liberdade Condicional do Canadá. Sua carreira no sistema penitenciário e liberdade condicional abrange mais de 25 anos, tendo trabalhado em diferentes cargos que incluem oficial de liberdade condicional, conselheira de política sênior, diretora-geral de política e vice-comissária para mulheres no Serviço Penitenciário do Canadá. Foi a primeira Diretora Executiva da ICPA, tendo liderado o estabelecimento formal dessa Associação. Recebeu inúmeros prêmios de distinção, incluindo a Medalha Jubileu de Diamante da Rainha Elizabeth II. A senhora Oades é formada em Antropologia e Estudos Nativos pela Universidade de Trent.