Os ‘lobos solitários’ – terrorismo e (in)sanidade mental

Livro

João Paulo Ventura

Coordenador de Investigação Criminal na Unidade Nacional Contraterrorismo da Polícia Judiciária, Portugal

De que forma esta obra explora a interligação entre terrorismo e saúde mental?

JPV: Essa ligação é hoje crescente e está perfeitamente documentada nos factos. Os fatores determinantes e que motivam o comportamento criminal neste domínio da ação terrorista são múltiplos e complexos. 

Procurei distribuir os ‘atores solitários’ em três categorias fundamentais: os psicóticos, padecendo de doença psiquiátrica grave, que em virtude da sua consciência alterada são os únicos porventura isentos de responsabilidade criminal, beneficiando de causa de exclusão da culpa; aqueles que sofrem de desordens da personalidade antissocial, nomeadamente os psicopatas, que à luz da lei criminal, são considerados imputáveis e sujeitos à aplicação de reações penais e finalmente os que revelam essencialmente desajustamentos psicossociais, não estão forçosamente afetados por perturbações de saúde mental em sentido lato, mas por influência desses desajustamentos, podem assumir comportamento criminal. 

Provavelmente, muitos daqueles que integram a categoria intermédia – e.g. psicopatas ou sociopatas – são também sujeitos desajustados do ponto de vista psicossocial. Mas são as perturbações da personalidade antissocial os determinantes nevrálgicos da sua passagem ao ato.

Não é hoje possível apreciar a atuação destes atores do terrorismo, ditos ‘lobos solitários’, sem inescapável referência às questões da sanidade mental. Da saúde mental, ou sobretudo, da ausência dela.

Analisei 18 casos registados nos últimos 45 anos, entre 1978 e 2022, em nove países, de três continentes.  Um pioneiro ‘ator solitário’, o ‘Unabomber’, surgido na cena do terrorismo doméstico nos EUA em 1978, condenado a pena de prisão perpétua e recentemente falecido. foi longamente dissecado.

Qual a importância de abordar esta dualidade no panorama atual?

JPV: Não apenas porque é crescente a correlação entre terrorismo e (in)sanidade mental mas também na medida em que e apesar do significativo abrandamento na frequência de atentados terroristas nos últimos cinco anos (depois do vertiginoso triénio 2015-2017, em que a intensidade dos ataques na Europa foi inédita e avassaladora) pelo menos desde 2019, os ‘atores solitários’ estão na vanguarda da atuação e da ameaça terrorista. Predominam enquanto protagonistas dos atentados e esse padrão é comum aos dois principais segmentos de ação criminosa de inspiração político-ideológica: jihadismo e extrema-direita.

Assim mesmo e considerando que os atores solitários não pontificam no vácuo, não são imunes à influência social nem à radicalização ideológica – e ainda porque as performances terroristas não estão desvinculadas de certos momentos e dinâmicas políticas e sociais – decidi enquadrar o tema  no contexto da pandemia COVID-19, abordei o novel conceito das ameaças híbridas (com impactos na desinformação e segurança no espaço cibernético) e apreciei o quadro da guerra de agressão, da Federação da Rússia contra Ucrânia, que prossegue desde fevereiro de 2022.

Procurei desvendar temas atuais e pertinentes, tentando também preencher uma lacuna editorial em língua portuguesa.

João Paulo Ventura é Coordenador de Investigação Criminal na Unidade Nacional Contraterrorismo da Polícia Judiciária Portuguesa. Com 37 anos de experiência na organização, dedicou a maior parte da sua carreira à área de contraterrorismo e combate ao extremismo ideológico criminal, domínios em que é formador nacional e internacional (CEPOL). É auditor de defesa nacional e licenciado em Psicologia com pós-graduação em Psicologia Legal e Medicina Legal. É autor de diversas publicações sobre radicalização ideológica e terrorismo e presentemente é conselheiro na área Justiça e Assuntos Internos na Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia, em Bruxelas.

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